Um grande “X” azul. Este foi o sinal utilizado pela Prefeitura de Ubatuba para demarcar os túmulos que apresentam alguma irregularidade no cemitério central da cidade. As lápides, que não estão identificadas, ou em mal estado de conservação, foram marcadas com um, ou até seis “X” de tinta azul, por funcionários, que obedeceram a ordem do Gerente de Cemitérios da Prefeitura.As demarcações foram acompanhadas de placas, que informavam, justamente no feriado de Finados, que os túmulos pintados seriam retomados em definitivo pelo cemitério, caso seus proprietários não dessem entrada no processo de regularização.Os munícipes e visitantes ficaram revoltados com a ação da Gerência do Cemitério, em quase metade dos túmulos lá instalados. A aposentada Maria Barbosa, que tem o esposo e irmã enterrados no local, considerou um desrespeito as marcas feitas pelos funcionários da prefeitura. “A lápide da nossa família tinha uma quina de concreto quebrada e fizeram um monte de “X”. Isso é um absurdo, não se pode nem mais descansar em paz”, completa indignada a moradora da cidade.Segundo testemunhas, durante o feriado, alguns visitantes chegaram a perder a paciência querendo explicações dos responsáveis pelo ato. O Gerente de cemitérios de Ubatuba, Lúcio Flávio da Silva, assumiu as marcações e afirmou que “nenhuma administração deu liberdade para a gerência dos cemitérios trabalhar e cobrar maior responsabilidade dos proprietários, e a situação foi sendo levada com a barriga. Atualmente, quase metade dos túmulos não está em condições, além de muitos, serem até irregulares, se eu não tomasse uma medida para chamar a atenção de todos, a situação continuaria”, completa o Gerente de Cemitérios da prefeitura.Ele acrescentou que, caso não seja tomada nenhuma medida para a regularização dos espaços, a Lei Municipal 1765/98, prevê a retomada definitiva dos túmulos. Entretanto, quando questionado pela reportagem sobre o constrangimento da ação e a possibilidade de outra forma de abordagem, Lucio Flavio respondeu: “Posso até responder pelos “X”, mas espero que isso dê resultado e os túmulos apresentem condição para os sepultamentos”. O resultado da ação ainda não pode ser analisado.O Ministério Público Local atendeu a representação do Procurador de Justiça José Guerra Armede e irá abrir um inquérito contra a atitude do administrador, que prestou depoimento na tarde de ontem ao Promotor de Justiça local. O autor da denúncia, Procurador José Guerra, explicou, com exclusividade ao Jornal Imprensa Livre, o motivo da representação e da indignação com o que ele chama de vandalismo oficial.Acompanhe o depoimento do Procurador de Justiça:“Fiz a representação, pois visitando o cemitério no dia de Finados, me deparei com o quadro terrivelmente macabro, consistente na pichação de inúmeros túmulos e de placas anunciando que tal pichação (X) se dava em razão de irregularidades atribuídas às famílias que lá possuíam pessoas sepultadas. Em uma das placas, verifiquei, inclusive, a terrível ameaça de “retomada definitiva dos túmulos, se não fossem devidamente regularizados”. Estarrecido, diante de tamanho vandalismo oficial, tomei a iniciativa de representar ao Ministério Público da Defesa do Consumidor, comunicando o fato e pedindo as providências jurídicas cabíveis. Tomei a iniciativa, porque os fatos denunciados são expressamente proibidos pelo Código de Defesa do Consumidor, e este não deve ser submetido à cobranças constrangedoras, vexatórias e ridicularizantes como ocorreu no caso.Os fatos cometidos no cemitério de Ubatuba expõem a administração pública municipal à cobrança judicial de indenização por danos, inclusive morais, bem como sujeitam os seus autores a responderem processo criminal (artigos 42 e 71 do Código de Defesa do Consumidor).Observo, ademais, que se por absurdo, não se entender que há uma relação típica de consumo de serviço público, mesmo assim se estaria cometendo o delito de exercício arbitrário das próprias razões, este previsto no artigo 345 do Código Penal Brasileiro. Ressalto também, que os delitos são agravados, porque atribuídos a servidor público, além de se referirem à serviço público essencial, conforme previsto no Código de Defesa do Consumidor. Por derradeiro posso afirmar que fui ao cemitério fazer uma homenagem a pessoas da família de minha esposa e velhos amigos caiçaras que já se foram e que mereciam aminha visita e a minha saudade. Por isso também posso afirmar que em tese, os fatos que presenciei no cemitério de Ubatuba podem, até, constituírem crimes contra o respeito aos mortos, previstos nos artigos 209 e 210 do Código Penal Brasileiro”.
Fonte:
Imprensa Livre